sábado, 30 de março de 2019

"O Dia em que Perdemos a Cabeça" de Javier Castillo [Opinião]


No início deste ano, a Suma de Letras apresentou-nos o primeiro romance de Javier Castillo, numa campanha que certamente terá chamado a atenção de muitos leitores. A editora lançou o desafio: atreve-te a descobrir o mistério do ano sem perder a cabeça.

A campanha publicitária funcionou comigo. Fiquei imediatamente curiosa e comprei o livro. E esse foi o dia em que perdi a cabeça.

O livro apresenta-nos uma premissa promissora. A pequena introdução de duas páginas deixa-nos completamente agarrados. Como é possível resistir à imagem de um homem nu, a caminhar pelas ruas, transportando uma cabeça decepada nas mãos?

Tenho de admitir que o livro é realmente viciante no início. Li as primeiras 200 páginas quase de um só fôlego. Contudo, depois do entusiasmo inicial, comecei a aperceber-me de imensas coisas que não faziam sentido neste livro.

A história tem o seu início num centro psiquiátrico, o que me pareceu desde logo uma ideia ambiciosa. O Dr. Jenkins é o psicólogo que dirige o local e vai ser ajudado por Stella Hyden, uma agente do FBI especializada em perfis criminais.
Desde este momento que o autor revela que não se deu sequer ao trabalho de investigar o que é a psicologia, como funciona um hospital psiquiátrico, como se faz um perfil criminal e, muito menos, o que é uma avaliação psicológica.

Temos um psicólogo rude, que maltrata os seus funcionários e que não faz mais nada além de ameaçar que vai aplicar terapia de choques até o alegado assassino decidir começar a falar. E depois temos a especialista em perfis criminais que quase desata a chorar só de estar frente a frente com o temível homem que segurava a cabeça decepada.

Cheguei a ler uma opinião que dizia que é um livro de ficção, logo os procedimentos não têm de ocorrer tal como são na realidade. Não concordo. Nota-se num livro quando o autor pesquisou, falou com profissionais e procurou fazer uma abordagem mais real dos temas.
Eu, tal como certamente muitos outros leitores, gosto de ler procedimentos policiais corretos, gosto de livros que me possam ensinar alguma coisa, seja sobre um determinado tema ou sobre a época em que se inserem.
Este é um livro contemporâneo, por isso pareceu-me um pouco ridículo quando o autor começou a fantasiar. Se eu quisesse ler fantasia, teria procurado outro livro.

[Fotografia da minha autoria]

O livro vai alternando entre três espaços temporais: o presente, o passado (dezassete anos) e o passado recente (um dia antes). A mim não me fez muita confusão e até gostei desta estrutura, mas é necessário alguma ginástica mental para acompanhar, principalmente para quem for ler o livro de forma compulsiva.

As personagens estão mal construídas e apresentam comportamentos completamente incongruentes. Não senti qualquer afinidade com nenhuma das personagens e muito menos fui capaz de compreender as suas motivações para os crimes que aconteceram neste livro.

Os diálogos são risíveis. Todas as personagens falam exatamente da mesma maneira, não importando se é um advogado, um psicólogo, uma criança de 8 anos ou uma adolescente. Não há falas distintivas nem que separem os seus traços de personalidade. Muitos dos diálogos parecem até não servir para nada, a não ser para revelar alguma informação necessária naquele exato momento.

Como referi acima, a primeira metade do livro lê-se num ritmo alucinante. No entanto, a segunda metade do livro perde o ritmo e precisei de um pouco mais de esforço para me determinar a chegar ao final, esperando que este fosse suficientemente recompensador.

O final foi certamente um dos piores finais que já encontrei num thriller. É completamente ridículo e nada credível. Algumas coisas são explicadas de forma muito tosca e outras são deixadas em aberto. Há um segundo livro (que já está publicado em Espanha) que dá continuidade a esta história e que eu não tenciono ler nem que seja o último livro disponível à face da Terra.

Muitos destes aspetos que referi ao longo da minha opinião até se perdoariam num livro lançado em edição de autor - que foi o que aconteceu a este livro antes de ser publicado numa editora. Já não é tão compreensível que, depois de o autor ter trabalhado com editores, estes tenham achado que este livro teria potencial.

O que me arreliou mais foi o ter ido comprar o livro de imediato, acreditando que seria incrível, conforme nos prometia a campanha publicitária. Devia ter sido mais ponderada, ter ido pesquisar opiniões primeiro, para não apanhar uma desilusão tão grande.

Eu respeito o trabalho dos autores, sei o que custa, sei que são necessárias horas de dedicação. Mas também não gosto de cair em publicidades enganosas. E este livro fez-me sentir insultada. É um daqueles caso em que apenas interessa vender, mesmo que a qualidade seja quase inexistente.

Peço desculpa se a minha opinião soou um pouco mais agressiva, mas gosto de ser honesta e sinto-me muito mais aliviada e com uma sensação de liberdade depois de ter escrito estas palavras. Continuo interessada em conhecer as vossas opiniões, que podem obviamente ser diferentes da minha. Espero até que tenham tido uma experiência de leitura mais agradável do que a que eu tive.
Classificação: 1/5 estrelas

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